25/04/13

300.000 VISITAS AO BLOGUE BARCO À VISTA

          O blogue BARCO À VISTA ultrapassou as 300.000 visitas registadas desde 18/06/2009, totalizando até ao momento:
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- 188 seguidores;
- 503 comentários aos artigos publicados.
 
O autor agradece a todos os leitores!

QUAL É A TUA ONDA?

 
          O site do Instituto Hidrográfico dispõe uma página de apoio ao Surf: “Qual é a tua Onda?”, fruto do Protocolo de Colaboração assinado com a Federação Portuguesa de Surf, que permite ter conhecimento da previsão das condições para a prática de Surf, em várias praias da costa portuguesa.
          Esta aplicação - a previsão das condições para a prática de Surf, visa apoiar o desenvolvimento desta actividade em Portugal, através da produção e divulgação das previsões detalhadas da agitação marítima que rebenta nas nossas praias.
          Esta informação, única no nosso país, resulta da combinação de um conhecimento preciso da topografia litoral aliado à modelação detalhada do ciclo de vida da agitação marítima, validada por uma rede de observação em tempo real.
 
MAIS INFORMAÇÕES:

08/04/13

ARTE MILITAR NAVAL - 01

(ACTUALIZADO)

          Seguindo uma concepção do blogue Defesa Nacional, apresentando pinturas de material militar utilizado pelas nossas Forças Armadas, decidi igualmente promover os desenhos de navios da Marinha de Guerra Portuguesa de um antigo Marinheiro da "Briosa":
          Luís Filipe Silva, 60 anos, natural de Lisboa (Bairro América), ingressou na Armada em Outubro de 1974, na Escola de Alunos Marinheiros (G1EA em Vila Franca de Xira).
          Concluída a Recruta, frequentou o ITE e o 1.º grau da especialidade de Radarista igualmente em Vila Franca. Entre 06/10/1975 e 31/01/1977 fez parte da guarnição da Corveta NRP "João Coutinho", tendo efectuado uma Comissão de Serviço de 03 meses no Arquipélago dos Açores.
          Morando em Lisboa com uma janela virada para o Rio Tejo, no tempo em que muitos navios fundeavam ao largo, ao observá-los atentamente, nutriu uma paixão por navios.
          Em 1970, com o intuito de divulgar os navios portugueses, começou a dedicar-se ao desenho manuscrito dos navios no activo e, mais tarde não havendo nenhuma publicação com os navios de propulsão mecânica da Armada, resolve começar a compilar em catálogo quase todos os navios da Armada, tendo inclusivo estendido o seu trabalho à Marinha Mercante.
          Passados 43 anos, ainda hoje continua a actualizar dentro do possível os desenhos manuscritos da sua autoria, todos eles encontram-se patentes no Fórum Defesa, vários têm sido utilizados para ilustrar artigos neste blogue e  os que retratam Navios-Hidrográficos da Marinha de Guerra Portuguesa, são utilizados na contracapa da Revista da Armada.
 Configuração das Corvetas da classe "João Coutinho" na actualidade desde 2006 e em 1975.

Artigo sobre as corvetas da classe "João Coutinho":
http://barcoavista.blogspot.pt/2009/11/corvetas-da-classe-joao-coutinho.html

03/04/13

“HISTÓRIAS À VISTA” - 28

          28.ª “HISTÓRIA À VISTA”, da autoria do 1.º Comandante do Navio de Apoio “NRP São Miguel” - CMG REF Oliveira e Costa (1985-1988), narrando a chegada do NRP "São Miguel" a Moçambique.
 
MEMÓRIA N.º 10: Sr. Mestre apita à Faina dentro de meia hora...
 
          28OUT87. Era a primeira vez depois da Independência, doze anos já passados, que um navio da Marinha de Guerra Portuguesa vinha a Moçambique. Uma aragem morna envolvia e percorria todo o navio. Estávamos cansados e aquela temperatura amena sabia-nos muito bem.
            Alguns estavam gratos, profundamente gratos, por estarem ali navegando à vista da nunca esquecida Lourenço Marques hoje, bela como antigamente, a Cidade de Maputo, fazendo-os recordar, comovidamente, quanto do seu passado distante e próximo. Pedaços que interiorizavam, desde os bancos da Escola Primária. De novo concretizava-se o sonho secreto de, simplesmente, voltar a Moçambique, entrelaçar-se nessa terra saudosa, conviver com as suas gentes e recordar também quanto da sua vida ali pertencia.
          Outros, que pela primeira vez demandavam aquelas latitudes, “tentavam apanhar” tudo o que ao seu lado ia sendo relembrado, comungando com admiração e respeito, da ansiedade dos primeiros bem como das recordações relatadas com tanto arrebatamento. Naqueles momentos só o Piloto russo destoava que, tagarelando, ia entremeando na sua conversa, perguntas que nada tinham que ver com as qualidades náuticas do navio!
          O Dr., na asa da Ponte, com a máquina de filmar, ia recolhendo as vistas, e o ambiente do momento, actividade que mereceu primeiro olhares reprovadores do Piloto e depois referências verbais sobre a segurança. Ri-me na cara dele e não liguei mais ao assunto! Havia outras coisas com que me preocupar, pois a maré vazava com força e seguíamos junto a terra, contudo a partir dessa altura comecei a tirar fotografias a tudo o que mexia e não mexia.
          Por fim o Piloto já ia identificando os diversos locais antes de serem fotografados! O Imediato, que mais recentemente por lá tinha passado, ia recordando, na maioria das vezes jocosamente, naquela sua maneira de ser tão própria, acontecimentos e peripécias vividas deixando em todos boa disposição e o desejo de desembarcarem rapidamente!
          O cheiro da terra ia invadindo o navio e impregnando-se em nós. Conforme o navio avançava iam surgindo novas informações e explicações de coisas do “antigamente” e de tantas histórias então vividas, perante a curiosidade e muita atenção dos presentes. Íamos atracar na zona do cais, atribuída aos navios de guerra, quando do tempo da Administração Portuguesa, uma simpática deferência conforme viemos a saber mais tarde.
          Largámos o ferro de BB e atracámos por EB. Dobrámos a amarração e foi passada a prancha em cuja sanefa, de lona azul-marinho, se lia em letra garrafal de um branco brilhante NRP SÃO MIGUEL. Ao Piloto foi oferecida uma garrafa de Vinho do Porto que agradeceu, com um forte aperto de mão, desnecessário face ao sorriso e olhar guloso que mostrou ao recebê-la!
          O Oficial de Ligação foi o primeiro a entrar a bordo. Apresentou-se e cumprimentou-me bem como ao Imediato, Mestre Vasconcelos e Sarg. FZ Sezinando. De forma respeitosa, mas muito à-vontade, apresentou-se perguntando logo de seguida se a viagem tinha corrido bem, que nos dava as boas vindas e pediu o Manifesto de Carga. A minha experiência da Capitania do Porto da Horta veio ao de cima. Fiquei surpreso e perguntei-lhe para que queria o manifesto de carga do navio. Respondeu, sempre a sorrir, que era para entregar na Alfandega para serem pagas as taxas devidas dizendo-o com naturalidade e rematando com um sorriso.
          Quando, a 12SET87, atracados no MOTBAY (Military Ocean Terminal Bayonne Newark N. Jersey) a Ordem Soberana de Malta recusou o embarque da sua oferta de 2.200 toneladas devido a divergências entre a Ordem e o Governo de Moçambique, através do seu Embaixador na ONU, impondo uma percentagem na distribuição (50% para o Governo e 50% para as confissões religiosas) querendo, além disso, que fossem dispensados certos artigos, que as autoridades dos EUA não permitiram retirar do bolo geral, ficando assim reduzido, a menos de 200 toneladas, o material que ali carregámos, oferta singular, de um Cavaleiro da Ordem Soberana de Malta, dirigida à ADRA (Adventist Development and Relieve Agency), em Maputo, e à Caritas, em Nacala.
          A “pedrinha” que, no MOTBAY, se “alojara no meu sapato” quando foi decidido não embarcar a oferta da Ordem Soberana de Malta transformara-se, com aquele pedido inopinado, e naquele momento, numa muito incómoda “pedra”! Devagar e com calma expliquei ao Oficial de ligação, Sr. Guarda Marinha Teodoro dos Santos Lingande (que nos acompanhou, ao longo de toda a nossa estada em Moçambique, tendo-se tornado mais um elemento da guarnição, “destacado” para o navio logo nesse primeiro dia) que o NRP “São Miguel” era um navio da Marinha de Guerra Portuguesa, que não tinha Manifesto de Carga e transportava uma oferta do Governo de Portugal, “País irmão mais velho”, em resposta ao pedido internacional feito pelo seu governo.
          Como que justificando o seu pedido informava que a ajuda que chega ao porto de Maputo é sempre onerada das taxas devidas. Senti que estava num impasse. A “pedra no sapato roía-me o pé dolorosamente”! Também com um sorriso disse ao Sr. Guarda Marinha Teodoro que, naquelas condições, não se efectuaria qualquer descarga e que sairia para o mar pedindo-lhe que diligenciasse, junto de quem de direito, para rever a situação dizendo, de seguida, ao Oficial Imediato para preparar o navio pois íamos largar e ao Mestre “Sr. Mestre apita à Faina dentro de meia hora.. .”.
          O GM Teodoro “compreendeu” a situação. Pediu licença para ir a terra, informou que estaria de volta logo lhe fosse possível e… por onde entrou, saiu! Senti-me só. Lembrei-me de uma situação também delicada passada comigo em finais de 1976, era eu Capitão do Porto da Horta, quando retive a embarcação de pesca “Trio de Ribamar”, de Peniche, que entrara no Porto da Horta não trazendo pessoal qualificado, para a governar, nem meios de salvação para a sua tripulação.
          A pressão do Comando Naval dos Açores (CNA) era insuportável. A minha posição irredutível. “A embarcação só será autorizada a seguir viagem logo apresente pessoal qualificado para a governar e tenha meios de salvação embarcados ou então, muito simplesmente, enviarem uma mensagem para a libertar nas condições em que se encontra”.
          Com algumas peripécias pelo meio fui chamado ao então Comodoro Comandante do CNA. Apanhei o avião da SATA para S. Miguel e no dia seguinte, logo de manhã, regressei, também de avião, para a Ilha do Faial. Mantive a minha posição tendo sido informado de que o Secretário de Estado das Pescas, Pedro Coelho, telefonara solicitando a libertação da embarcação e depois o Sr. General Ramalho Eanes tinha também telefonado para saber o que se estava a passar com a embarcação “Trio de Ribamar”.
          Agradeci a frontalidade das informações que me passara e limitei-me a responder, ao Sr. Comodoro, que reiterava a posição anteriormente assumida insistindo que para libertar a embarcação teriam de ser reunidas as condições já, por mim, aduzidas. Alguns dias mais tarde a embarcação saía do Porto da Horta, com destino a Lisboa, sendo comboiada até meio da viagem, por uma Corveta, em comissão nos Açores, sendo aí rendida por uma outra, saída de Lisboa, que comboiou a “Trio de Ribamar” até ao final da viagem.
          Como meios de salvação levava uma balsa pneumática cedida por um Aviocar que, por isso, ficou retido na Placa, no Aeroporto da Horta, aguardando a sua devolução. Chegada a Lisboa a Balsa foi enviada por via aérea para a Ilha Terceira e daí transportada, noutro Aviocar, para a Ilha do Faial onde foi entregue permitindo o regresso do avião que ali ficara retido à Base das Lajes! Triste, hilariante e… verídico!
          Mais tarde, numa recepção, dei-me a conhecer a Pedro Coelho que “se lembrou” imediatamente daquela “ocorrência” para, logo a seguir, virando-se para a minha mulher lhe dar os parabéns pela integridade do marido! O tempo passava… os que estavam à prancha ali continuaram como que grudados ao pavimento. Surge então uma viatura, que estaciona junto ao navio e dela sai o GM que, subindo a prancha em acelerado, nos trás a notícia de que “tudo estava resolvido e que o navio podia efectuar a descarga sem quaisquer formalidades! ”.
          O Imediato saiu com o Mestre para preparar o navio para a descarga, o Sarg. FZ Sezinando manteve-se à prancha, com o seu pessoal, e eu convidei o GM Teodoro a vir à Câmara de Oficiais para beber um Whisky! A partir daí o bem-parecido e sorridente Oficial de ligação “estacionou” a bordo mantendo com toda a guarnição um relacionamento fácil, amigável e caloroso que muito facilitou toda a actividade do “São Miguel” durante a permanência nas águas de Moçambique.
          Apreciei o convívio com o GM Teodoro. Por ele soube muito da vida de Moçambique das suas gentes e dos portugueses que por lá ainda labutavam. Apesar de jovem e ainda Guarda Marinha percebi ser um homem ponderado e muito bem informado. Sabedor da sua área de actividade profissional, não escamoteei quaisquer respostas às suas perguntas e senti reciprocidade na forma como nos acolhia.
          Durante a nossa passagem por Moçambique fomos bem tratados e respeitados. Talvez o mesmo não diga o Ten. Pico. Certa tarde, quando chegava ao navio de bicicleta “Made in China”, acabada de comprar, deixou-a junto à prancha que subiu para vir a bordo. A maré estava cheia e a prancha estava íngreme e escorregadia. As amplitudes de maré eram grandes o que nos obrigava a colocar a prancha, ora na Ponte ora no convés, tornando mais seguro e fácil a passagem de e para o navio. Quem estava de serviço reparou num homem saindo da multidão e correndo com agilidade, saltou, montou na bicicleta e sumiu no meio da confusão de pessoas que acompanhavam a descarga, na esperança de recolher algum material que caísse das camionetas!
          Nunca mais soube do Guarda Marinha Teodoro mas daqui lhe envio um pensamento de gratidão pela amizade com que nos presenteou e acrescento a carta enviada pelo comando do NRP “São Miguel” ao Director das Relações Internacionais do Ministério da Defesa de Moçambique onde é manifestado o reconhecimento pela actividade desenvolvida pelo Oficial de Ligação.
Ex.mo Sr. Tenente General Pedro Odallah Dig.mo Director das Relações Internacionais do Ministério da Defesa Nacional de Moçambique.
          Ex.mo Senhor na hora do regresso a Lisboa desta histórica viagem, do primeiro navio de guerra português que escalou Moçambique depois da sua independência, muito agradeço a V. Ex.ª todo o cuidado e atenções dispensadas ao navio ao longo da nossa permanência em Moçambique de que todos levamos gratas recordações.
          Peço licença para louvar a escolha criteriosa do Guarda Marinha Teodoro dos Santos Lingande para oficial de ligação sem o qual a nossa missão teria sido muito mais demorada e mesmo por vezes de difícil execução. Oficial ponderado e modesto soube sempre com muita cortesia, dedicação e respeito resolver todas as situações a que foi chamado demonstrando competência e brio profissional que o credenciaram junto do comando do NRP “São Miguel” como um excelente e imprescindível elemento que consideramos muito honrosamente como fazendo parte da guarnição deste navio.
            Espero que o sucesso desta histórica viagem sirva de exemplo e convite para um verdadeiro estreitamento de amizade e dos laços de cooperação com Moçambique. Respeitosos cumprimentos.”.
          Ainda e para que conste, sinto a obrigação de registar, nesta primeira Memória do navio em Moçambique, que diariamente, enquanto atracados, nos Portos de Maputo, Beira e Nacala na cerimónia de içar e arriar a bandeira o pessoal à vista, no cais, descobria-se e parado aguardava respeitosamente o final da cerimónia para continuar o seu caminho. Por diversas vezes me senti comovido. Ainda corria muito do bom e generoso sangue português nas veias daquele povo…
 
Um saudoso e agradecido abraço ao GM Teodoro.