21/01/17

ARTE MILITAR NAVAL - 09

          Regressando de novo à resenha "Arte Militar Naval", onde apresento os desenhos manuscritos de Luís Filipe Silva, escolhi para este artigo as Fragatas da classe "Bartolomeu Dias", navios de construção holandesa e adquiridos pela Marinha Portuguesa em 2006, entrando posteriormente ao serviço da Briosa respectivamente em 2009 e 2010, sendo a par das Fragatas da Classe "Vasco da Gama", os nossos únicos navios de combate de superfície.


Configuração das Fragatas da classe "Bartolomeu Dias"

Artigo sobre as FRAGATAS DA CLASSE "BARTOLOMEU DIAS":
http://barcoavista.blogspot.pt/2011/01/fragatas-da-classe-bartolomeu-dias.html

11/01/17

NAVIO DE APOIO LOGÍSTICO “SÃO MIGUEL” / 4.ª PARTE

A 3.ª GUARNIÇÃO DO NAVIO

          A 24 de Maio de 1990, realiza-se a bordo a entrega de Comando do navio, presidida a bordo pelo então Vice-Almirante Comandante Naval do Continente.


















Entrega do Comando do navio (Foto cedida por Cte. Brito Subtil)

             Entre 21 de Junho e 10 de Julho de 1990, efectuou missões logísticas nos Arquipélagos da Madeira e Açores, escalando Praia da Vitória, Ponta Delgada e Funchal.
          A 14 de Setembro de 1990, é montado um novo radar JRC-JMA 3525 (com sistema RASTERSCAN de digitalização de imagem) pela empresa Ondex, substituindo o radar KH 18/12, abatido ao navio através da Guia de Remessa n.º 119/90 de 17 de Setembro de 1990, devido à sua idade avançada e já muitas limitações (detecção de ecos somente a 08 milhas, avaria na marca móvel, inexistência de sobressalentes, etc).

MISSÕES EM 1991:

MISSÃO NA GUERRA DO GOLFO PÉRSICO:

         Entre 31 de Outubro de 1990 e 13 de Abril de 1991, no âmbito da colaboração da UEO (União Europeia Ocidental) nas operações de embargo ao Iraque decretadas pelo Conselho de Segurança da ONU, foi o único navio da Armada Portuguesa a participar quer no embargo quer na Guerra do Golfo de 1991.
          O principal motivo que originou a participação supracitada do navio, advém do facto de ser o então único navio da Marinha de Guerra Portuguesa que desempenhava as funções de “Navio de Apoio Logístico” e, que por inerência preenchia o requisito que a 30 de Agosto de 1990 o Governo Português no âmbito da colaboração com as forças da UEO no embargo decretado ao Iraque, decidiu disponibilizar - um Navio de Apoio Logístico e de não participar ofensivamente com tropas destacadas no TO, conforme apelo de envio de reforços por parte do então Secretário de Estado Norte-americano James Baker aos Aliados da NATO.















"São Miguel" atracado na  Doca da Marinha (Foto cedida por Luís Miguel Correia)

          Efectuou duas viagens de ida e volta do Porto militar de Marchwood, em Southampton - Reino Unido, para o Porto de Al-Jubail - Arábia Saudita, transportando diverso material militar do Exército britânico e kuwaitiano, no mais curto prazo de tempo, para as suas tropas estacionadas na Arábia Saudita, missão designada por «Operação Granby» nome de código atribuído pelos britânicos à operação de transporte logístico para as suas forças no Golfo Pérsico destacadas na “Operação Tempestade no deserto”:
- Material electrónico;
- Equipamento de Engenharia Militar (24 secções de pontes);
- Peças do carro de combate britânico CHIEFTAIN Mk5 MBT;
- 700 paletes de lagartas de carros de combate;







































Faina de carregamento do porão com paletes de lagartas de carros de combate (Foto de Cte. Rodrigues da Conceição)

- 06 canos de peças de artilharia de 120mm da ROYAL ORDNANCE;
- 200 paletes de rações de combate;
- 187 paletes de pratos de comer;
- 163 paletes de Heliportos LONG MARSTON;
- 79 paletes de redes de camuflagem;
- 797 pneus GOODYEAR de camiões pesados;
- Vedações para campos de prisioneiros;
- Dezenas de paletes com munições de 120mm HESH / APDS da ROYAL ORDNANCE;
- 06 jipes LAND ROVER de ½ toneladas da engenharia britânica;
- 01 camião BEDFORD de 4 toneladas da engenharia britânica.
          O navio zarpou para a sua 1.ª viagem às 16:30 do dia 31 de Outubro de 1990 da Doca da Marinha, navegando 900 milhas até Marchwood, pouco antes da Fragata F483 NRP "Sacadura Cabral" destacada para a NAVOPFORMED no Mar Mediterrâneo, na presença em terra de entidades oficias políticas e militares, Banda da Armada, comunicação social, familiares, amigos e camaradas da guarnição.
          Já no Rio Tejo, foi saudado pela Nau "St.ª Maria" e dezenas de embarcações que apitaram e lançavam jactos de água, demonstrando a solidariedade e camaradagem dos Homens do Mar!
          Na primeira viagem, a missão foi cumprida em 60 dias (31 de Outubro a 29 de Dezembro de 1990), sendo a missão noticiada de certa forma negativa pela comunicação social nacional, não obstante as declarações abonatórias verbalizadas pelo então próprio CEMA e diversas autoridades militares britânicas que, satisfeitos com o desempenho do navio, solicitaram novamente a sua colaboração para outra viagem igual.












Fundeado em Cascais, já carregado, a caminho da 1.ª viagem ao Golfo Pérsico (Foto cedida por Cte. Paulo Breia)

          Por questões de precaução e segurança a bordo, durante as viagens a guarnição foi reforçada (09 Oficiais, 10 Sargentos e 49 Praças), sendo todos apetrechados com fatos e equipamento de protecção individual para guerra NBQ de fabrico inglês, guarnição que sempre se pautou por estar mentalizada, preparada e moralizada para o cumprimento da missão.






















Elementos da guarnição com fato de protecção individual para guerra NBQ (foto cedida por Emanuel Almeida)

          Conjuntamente o nível de segurança foi aumentada, por iniciativa do Aspirante da Reserva Naval na qualidade de Chefe do Serviço de Artilharia, assim quando a navegar eram colocadas 04 espingardas HK G3 e respectivas munições na Ponte de Comando, quando atracado as armas eram distribuídas pelo Grupo de Serviço, bem como 02 pistolas P38 WALTHER ao Oficial e Sargento de dia, como medida dissuasora e por forma a reforçar o controlo da entrada e saída a bordo de pessoas e bens estranhos à guarnição (estivadores, carregadores, militares, fornecedores, agentes, amarradores, etc).
          Foi igualmente elaborado e aprovado pelo Comando do navio em Setembro de 1990 (para em caso de necessidade), um Plano de Destruição do Navio por recurso a explosivos (cargas de demolição e explosivo plástico PE4A montados no costado dos três porões e casa das máquinas), com a colaboração do Centro de Instrução de Minas e Contra-Medidas.
          Durante a faina de descarga no Porto de Al-Jubail - Arábia Saudita a guarnição chegou a envergou os fatos e equipamento de protecção individual para guerra NBQ (nuclear, biológico e química) mais de 02 horas, devido a um alarme de ataque iraquiano ao local (onde se encontravam concentravas várias forças da coligação), motivado pelo lançamento de 03 mísseis balísticos terra-terra SCUD-B de fabrico russo pelo Iraque, mas desconhecendo-se o tipo de ogiva.
          De realçar que os fatos e equipamento de protecção individual para guerra NBQ eram de fabrico inglês e distintos dos habitualmente utilizados na Marinha Portuguesa, o que obrigou a algum treino da guarnição a empregar os mesmos no mais curto espaço de tempo em caso de necessidade.

























O Oficial Imediato apetrechado com fato e equipamento de protecção individual para guerra NBQ (foto cedida por Cte. Rodrigues Pereira)

          É ainda de referir que o navio encontrava-se na situação de «prontidão de 48 horas» desde 12 de Setembro, as autoridades inglesas enviaram um Oficial da RFA - Royal Fleet Auxiliary para visitar detalhadamente o navio e as suas características e antes de zarpar procederam-se a algumas melhorias em determinados equipamentos do navio:
- Navegação, Comunicações e Limitação de Avarias;
- Montagem de chuveiros contra ataque NBQ;
- Estanquidade das áreas habitacionais;
- Pintura das superestruturas.
Deste modo, na fase de aprontamento para a Missão ao Golfo Pérsico, as ajudas electrónicas à navegação foram aumentadas pela montagem em Lisboa de alguns equipamentos a título de empréstimo:
- Receptor Satélite Raytheon GPS Navigator Raystar 920;
- Receptor Sait Navtex 2 - XH5123;
- Receptor Facsimile Furuno DFAX;
- Girobússola SPERRY Mk27.
          Foi ainda instalado o radiogoniómetro Ondex Tayo TP - C338HS e um novo VHF SAIT RT 2048.
          A 09 de Abril de 1991, antes de zarpar de regresso definitivo a Portugal ocorre a despedida formal a bordo por parte das autoridades britânicas, representadas na pessoa do Brigadeiro Director-Geral dos transportes militares do MDN britânico, que deslocou-se de propósito de Londres para agradecer a colaboração do navio na "Operação Granby", honrando a mais velha aliança militar do mundo!




















Despedida das autoridades britânicas da guarnição do "São Miguel" (Foto de Cte. Rodrigues da Conceição)

          Na manhã do 13 de Abril de 1991, chega a Portugal atracando pelas 11:00 no cais n.º 08 da BNL, após 06 meses de missão, sendo recebido pela Banda da Armada, familiares, camaradas, amigos, um representante do MDN, Oficiais de serviço ao CNC e EMA.





















Oficiais do navio dotados de turbantes coloridos (Foto cedida or Cte. Rodrigues Pereira)

          De salientar a presença de poucos órgãos de comunicação social e o facto de ter sido determinado superiormente atrasar-se a sua chegada, fora da barra, com o intuito de não ocorresse em simultâneo com a cerimónia presidida pelo então Primeiro-Ministro e presença do então Ministro da Nacional da entrega do Estandarte à Fragata F330 NRP "Vasco da Gama".
          Durante esta missão navegou cerca de 2.700 horas (correspondente a cerca de 100 dias), percorreu cerca de 28.000 milhas (1,5 o diâmetro do planeta no Equador), transportou 3.200 toneladas ao todo e escalou os Portos de Lisboa, Southampton, Marchwood, Potsmouth, Gibraltar, Marselha, Palma de Maiorca, Pireu (Atenas), Alexandria, Port Said, Port Suez, Al Jubayl, Damman e Fujhairah.























Rota efectuada pelo "São Miguel" (Imagem cedida por Cte. Rodrigues da Conceição)






















Atracado em Port Said, em frente da sede da Companhia do Canal do Suez (Foto cedida por Cte. Rodrigues Pereira)





















O "São Miguel" no Canal do Suez (Foto cedida por Rogério Marques)

          A 15 de Abril de 1991, findo as missões na guerra do Golfo Pérsico o Comandante do navio concede um louvor colectivo à guarnição do "São Miguel" ao abrigo do art.º 21 do RDM (posteriormente publicada na OA/1), tecendo elogios a dedicação, eficiência e esforço tendo em linha de conta as carências e limitações do navio, assim como o cumprimento das missões com uma elevada taxa de operacionalidade e navegação sem período de descanso no teatro de guerra.























Guarnição do navio (Foto cedida por Cte. Rodrigues Pereira)

          Diversas entidades militares e civis estrangeiras assinaram o Livro de Honra do navio e, a guarnição do navio deste período (3.ª guarnição) criou um autocolante alusivo à missão ”Golfo Pérsico / 90 – 91 / Estivemos lá”, baseado num concurso de ideias efectuado a bordo, igualmente durante vários anos reunia-se anualmente no dia 13 de Abril para um almoço de confraternização.

























Autocolante  alusivo à missão (Imagem cedida por Cte. Rodrigues Pereira)

          Ainda em 1991, o Comando do Navio solicitou a atribuição da Medalha Comemorativa das Campanhas e Comissões Especiais das FA's Portuguesas relativamente ao destacamento do “São Miguel” na Guerra do Golfo, mas não obteve Despacho, somente a partir de 2015 começou a ser atribuída por requerimento pessoal dos elementos da guarnição interessados.
          A título de curiosidade, a tripulação do avião Hércules C-130 da FAP também destacado para o TO foi agraciada individualmente com a Medalha de ouro de Serviços Distintos do MDN, pouco depois do seu regresso a Portugal e, o governo britânico atribuiu a todos os elementos militares e civis participantes na “Operação Granby” (estrangeiros inclusivo), uma medalha comemorativa.