26/03/12

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16/03/12

08/03/12

"HISTÓRIAS À VISTA" - 02

          Esta 2.ª “HISTÓRIA À VISTA”, também cedida pelo Oficial de Marinha CMG Ribeiro Zilhão (REF), versa sobre a 2.ª viagem da LDM 404 “Chipa” à localidade de Chipoka no Malawi, junto ao Lago Niassa:

          «Cerca de mês e meio depois da primeira ida, aí em fins de Maio de 66, efectuei a segunda ida a Chipoka, também acompanhado pelo 1.º Ten EMN Rabaça Pires. Por essa data já a LDM 404 tinha sido pintada de verde, o que disfarçava um pouco o seu aspecto de Unidade Naval.
          Por outro lado, também já tinham sido forjadas Cédulas de inscrição Marítima dos Serviços de Marinha de Moçambique que davam uma identificação falsa. Eram passadas pela Capitania dos Portos do Lago Niassa (a minha Cédula que dizia que eu estava habilitado com o 2.º ano da Escola Técnica, tinha a categoria de Electricista de 1.ª Classe e tinha cumprido o serviço militar na Armada, na incorporação de 53, tendo entrado como Grumete Electricista e saído como Cabo Electricista).
          A Cédula poderia servir para uma desenrascada inicial, mas era por demais evidente a sua falsidade se me visse metido numa alhada mais profunda - até porque o meu nome era bem conhecido na região. Por outro lado, desta vez neguei-me decididamente a levar armas.
          O programa foi levado com mais cuidado, e começou com uma paragem em Meponda, como se estivéssemos preparando a estação de transbordo. Daqui seguimos sem dificuldades para Chipoka, onde nos esperavam os homens do Jorge Jardim: o Pombeiro e o Moreira Rato.
          Já não me lembro porquê, mas foi impossível iniciar o reabastecimento no dia da chegada, pelo que, pela tarde, resolvemos os quatro (eu, Rabaça, Pombeiro e Moreira Rato) ir dormir a Palm Beach. Como aqueles tinham vindo numa carrinha tipo Land Rover (um modelo especial que possuía todo o conforto e do género caravana) resolvemos ir de viatura em vez de comboio. As picadas não ficavam nada a dever às do Niassa, apenas com a diferença de que o terreno não era montanhoso (enquanto que no lado moçambicano as montanhas entravam abruptamente pelo lago - fundo de peirau - no lado do Malawi tudo era planície e o fundo esparcelado).

          Em determinada altura, demos com um rio largo que era preciso atravessar para chegar a Palm Beach e que possuía uma única ponte que servia para apenas para o comboio. Ainda tentámos meter o Land Rover por entre os carris, mas não surtiu efeito.
          Quando estávamos a pensar em deixar a viatura e atravessar a ponte a pé, apareceram meia dúzia de negros perguntando-nos quem éramos e o que estávamos ali a fazer. Em poucos minutos a viatura ficou cercada de negros um dos quais, com uma farda tipo Régulo, exigiu revistar o carro. Estabeleceu-se um certo pânico nos dois representantes do Jardim, pois traziam armas na viatura. Mas tudo correu bem.
          Tivemos um longo diálogo em Inglês macarrónico para explicar que pretendíamos apenas atravessar a ponte para ir passar a noite em Palm Beach e como não podíamos passar com o carro íamos deixá-lo ali e voltaríamos no dia seguinte a buscá-lo. Desta longa explicação ficou por longo tempo uma piada entre mim e o Rabaça, resultante do número de vezes que tivemos que repetir a frase:
- "...now we cross the river; tomorrow morning we cross the river again...".

          O Régulo prontificou-se então a tomar conta do carro até ao dia seguinte, ideia que não nos agradava, mas que aceitámos, pois não tínhamos outra opção. Aliás acabou por ser positiva, pois quando regressámos no dia seguinte tudo estava na mesma e sabe-se lá o que teria acontecido se o carro tivesse ficado abandonado.
          Neste dia, o reabastecimento terminou muito tarde pelo que decidi sair só na manhã seguinte (o Pombeiro e o Moreira Rato já tinham seguido viagem para a capital). Como trazíamos connosco um bote de borracha com um motor de 40 cavalos eu e o Rabaça resolvemos Ir de novo dormir a Palm Beach, mas desta feita viajando no bote. Já tínhamos ido de comboio, de carro, porque não de bote? - era a nossa conclusão. Todo o mundo já nos conhecia na região e, por incrível que pareça, as relações eram das mais amistosas possíveis. É óbvio que era arriscado, pois se o motor avariasse não sei bem como sairíamos da situação. Mas fomos.
          Quando ao fim do dia chegámos à praia de Palm Beach, puxámos o bote para seco e lá ficámos no rondável habitual, tendo comido um bom jantar no restaurante do hotel com o já nosso amigo Gerente.

          No dia seguinte de manhã deparámos com o bote quase vazio e um tremendo temporal com enormes vagas caindo sobre a praia. Era possível que o bote tivesse uma pequena fuga de ar, como dizia o Rabaça; mas eu estava em crer que era mais devido à diferença de temperatura, pois durante a noite fizera bastante frio. De qualquer modo, deu-nos um trabalhão e uma canseira enorme encher o raio do bote com a bomba de pedal.
          Mas o pior foi metê-lo dentro de água por entre as vagas, pois empinou-se todo e só por milagre não se virou ao contrário. Por fim, extenuados, lá viemos para sul demandando Chipoka a toda velocidade. Ainda no caminho, fiz uma partida ao Rabaça imitando com a boca uma fuga de ar, enquanto ele espiolhava o bote à procura do furo... Nós dávamo-nos muito bem e tudo aproveitávamos para nos rirmos.
          Com os atrasos todos no reabastecimento (suposto ser feito só num dia), tínhamos saído dois dias depois. Como nos era interdito comunicar por rádio, em Metangula começaram a ficar nervosos e resolveram mandar a LFP "Marte" (comandada pelo 2.° Ten RN Abecassis) à nossa procura. Encontrou-nos a meio do caminho, quando já podíamos comunicar. Parámos mais uma noite em Meponda para confraternizarmos, rindo-nos a bom rir com as histórias vividas.»