09/09/12

O BOTE AERO-DESLIZANTE DA ESCOLA DE FUZILEIROS

MEIOS ANFÍBIOS

A necessidade aguça o engenho!


Bote aero-deslizante na Pista de Lodo da Escola de Fuzileiros (imagem cedida por Associação de Fuzileiros).

          Entre Março de 1962 e Setembro de 1968, foi utilizado na Escola de Fuzileiros uma pequena embarcação designada por "bote aero-deslizante", idealizada pelo então 1.º Tenente Maxfredo da Costa Campos (Oficial de Marinha com o curso FZE), inspirado nas embarcações "swamp airboat" empregues a nível civil em zonas pantanosas em diversos países.
          O casco foi construído artesanalmente por civis na zona da Foz do Arelho - Lagoa de Óbidos e os componentes mecânicos (motor e estrutura metálica) foram montados nas oficinas da Escola de Fuzileiros, adaptando material disponível no Depósito de Inúteis da Direcção do Serviço de Abastecimentos da Marinha de Guerra Portuguesa.
          Tratava-se de uma embarcação impulsionada por um motor radial em forma de estrela (KINNER B5 de 125cv) e respectiva hélice de madeira, oriundos de um antigo avião ligeiro (biplano de instrução FLEET 10G) da extinta Aviação Naval, encontrando-se o motor montado sobre uma estrutura metálica erigida na popa e a hélice devidamente protegida nas suas laterais por duas redes metálicas, uma acoplada a bombordo e outra a estibordo da embarcação.


Biplano de instrução FLEET 10G da extinta Aviação Naval (imagem cedida por Museu da Marinha).

          No tocante ao casco, este era construído em contraplacado marítimo, cujo fundo interno era revestido a chapa metálica somente no local onde se localizava a estrutura com o motor, por forma a suportar o seu peso (137 kg); por sua vez o fundo externo era quase chato, sem quilha nem obras vivas, diferenciando-se dos "swamp airboat", em virtude de estes últimos apresentarem uma proa recta e fundo completamente chato.
          De evidenciar o facto de, como o "bote aero-deslizante" era impulsionado por um motor de avião, a sua condução era realizada respectivamente por uma manete de avião, que permitia controlar um grande leme localizado na traseira da hélice de madeira.


Bote aero-deslizante com fundo quase chato, sem quilha nem obras vivas (imagem cedida por Associação de Fuzileiros).

          O desiderato inicial da construção do "bote aero-deslizante", cuja garagem de pedra e cal com rampa se situava a poucos metros da caldeira da Pista de Lodo, era permitir aos instrutores Fuzileiros deslizar neste local de treino, para rápido socorro a instruendos exaustos ou atolados no lodo, onde botes pneumáticos com motores fora de bordo e hélice submersa seria impraticável.


Bote aero-deslizante em socooro de um instruendo exauto no lodo (imagem cedida por Associação de Fuzileiros).

          Tinha a vantagem de conseguir atingir alta velocidade (mais de 100 Km/h) e ser dotado de grande manobrabilidade (conseguia rodar em torno do próprio eixo), no entanto, tal característica traduzia-se ao mesmo tempo no inconveniente de ser de difícil condução, efectuada mediante uma manete de avião aparelhada a meia-nau, em frente ao único espaço com banco na embarcação, destinado ao condutor e assistente.
          É de salientar que, em virtude de não dispor de mais bancos para o parco pessoal embarcado no espaço à vante do condutor (capacidade máxima para 04 militares), nomeadamente quando totalmente armados e equipados, estes confrontavam-se com más condições de transporte, no que toca a padrões ergonómicos e funcionais, de que resultava só poderem humanamente suportar pequenos percursos embarcados.


Bote aero-deslizante com 04 militares no espaço à vante do condutor (imagem cedida por Associação de Fuzileiros).

          Motivos que contribuíram para que não fosse muito utilizado operacionalmente fora da Pista de Lodo, tendo o “bote aero-deslizante” sido abatido ao efectivo em meados de 1969, após um pequeno acidente que lhe danificou o motor e deformou a hélice em Setembro de 1968.
          Não obstante, manteve-se por alguns anos guardado, mas sem manutenção nas instalações da Escola de Fuzileiros, tendo sido somente retirado após a criação da UAMA - Unidade de Apoio de Meios Aquáticos, em Junho de 1979.

          Para além da sua utilização na Pista de Lodo (entre a estrada Norte que dava entrada na Escola de Fuzileiros até a estrada na zona Sul, junto às cobertas da zona do convento) e Rio Coina, destaca-se:
- Em 1962, foi empregue em vários estados de maré, por instrutores durante um exercício de desembarque anfíbio realizado no Algarve, junto a praia do Campo de Treino de Minas e Demolições na Ilha da Culatra, situada na Ria Formosa, ao largo da cidade de Olhão;
- Acompanhou por vezes o desfile de viaturas anfíbias LVT-4 (deslizando sobre a Pista de Lodo), por ocasião da Cerimónia de Juramento de Bandeira dos Recrutas Fuzileiros, tendo a 1.ª vez sucedido no 4.º Curso de FZE (29/01/1962 - 31/03/1962), que a prática correspondeu ao 2.º Curso FZE a ser ministrado na Escola de Fuzileiros.


Imagem demostrativa do grande leme traseiro do bote aero-deslizante (imagem cedida por Associação de Fuzileiros).

          Curiosamente, alguns Oficiais Subalternos que conheceram o "bote aero-deslizante" durante a sua frequência do curso de FZE na Escola de Fuzileiros, aquando do seu destacamento em comissão de serviço para o TO do Leste de Angola (Chilombo, Lungué-Bungo e Rivungo) ou na Guiné-Bissau, ainda equacionaram formalizar um pedido de construção de um pequeno número destas embarcações melhoradas à Direcção Técnica da Armada.
          O objectivo visava, utilizar nas zonas de chanas do Leste de Angola e nas zonas de bolanhas da Guiné-Bissau, onde os botes pneumáticos “ZEBRO” e botes de fibra de vidro (sintex) "MARUJO" tinham dificuldade em deslocar-se e originavam por inerência um maior consumo de hélices.

FILME DO BOTE-AERODESLIZANTE:
https://barcoavista.blogspot.pt/2014/11/filme-do-bote-aerodeslizante.html

6 comentários:

  1. Mais uma vez, este nosso Amigo - da Marinha e dos seus Fuzileiros, dá prova da uma entusiástica entrega, não regateando esforços para trazer ao conhecimento de todos que tenham o privilégio de entrar no seu blogue, de quanto a Marinha de Guerra Portuguesa, é uma instituição, que nunca poupou energias, para bem servir a sua Pátria. Mais um abraço

    ResponderEliminar
  2. Curiosamente o bote e eu tivemos um percurso paralelo nos fuzileiros. Entramos ao serviço no início de 1962 e abandonámos o serviço na segunda metade de 1968.

    ResponderEliminar
  3. Parabens ao camarada Rodrigues Morais pela exastiva e completa descrição de um meio de desembarque histórico que é desconhecido de uma grande parte dos Fuzileiros,de mim inclusivé.
    Um grande abraço.

    Rogério Silva

    ResponderEliminar
  4. Não sabia da existência deste bote .... nunca ouvi falar . Sobre o nome UAMA penso que em 77 já existia , não tenho a certeza .

    ResponderEliminar
  5. Vi esta embarcação na EF em 1969, encostada a um canto. Foi pena que não tivessem obtido umas coisas destas bem rápidas para a patrulha dos rios da Guiná. Teria morrido menos gente.

    Ricardo Matias

    ResponderEliminar
  6. Tive o previlégio de conhecer o Bote em destaque. Ficou no ar a idéia de ser construído em grande escala, parece que o projecto foi abandonado. Mas fica o registo da grande capacidade de iniciativa, de quem tentou melhorar as operações noteatro de Guerra em que os Fuzileiros Especiais, estivem envolvidos.

    ResponderEliminar

Grato pelo seu comentário, prontamente estará visível!